A ética tem que vir de cima e permear por toda a empresa

Paulo Gomes

Até não muito tempo atrás e para alguns, ainda hoje, existe a crença de que a auditoria interna deve se concentrar apenas em avaliar as políticas, procedimentos e controles formais. Por esta lógica, aspectos menos tangíveis, como por exemplo, a cultura e comportamentos jamais deveriam entrar no escopo da área. No máximo, poderiam se debruçar sobre códigos de conduta e políticas de recursos humanos, permanecendo no campo de normas formalizadas.

Conceitos intangíveis, como ética, competência, estilo de liderança, confiança e reputação, que compõem a chamada cultura corporativa, deveriam ser preocupação de outras instâncias. A percepção de que aspectos considerados “soft” devem fazer parte do escopo e serem avaliadas pelas áreas de supervisão.

Atribuída equivocadamente ao pai da administração moderna Peter Drucker, a famosa frase de que “a cultura come a estratégia no café da manhã” resume com clareza o fato de que o compromisso com a ética tem que vir de cima e permear por toda a empresa. Ainda que não tenha dito exatamente a frase, Drucker menciona a cultura como aspecto vital para o sucesso (ou fracasso) dos negócios e de seu papel na sociedade em que vivemos.

O pensamento significa que a essência de uma empresa deve prevalecer sobre qualquer outro tipo de planejamento ou tática e que a cultura organizacional é o pilar mais forte. Isso se traduz de que objetivos bem definidos e visão financeira não servem de nada se as ações estiverem em conflito da cultura vigente da organização.

Atualmente, a constatação de que uma cultura tóxica e a uma governança corporativa ineficaz podem juntas destruir uma empresa e fica cada vez mais evidente com sucessivos casos de fragilidades internas que põem em risco a continuidade de negócios até então considerados sólidos e bem-sucedidos.

Podemos dizer que a auditoria interna tem um papel fundamental dentro das organizações e se tivessem inserido, décadas antes, este tema “cultura” em seu plano anual de auditoria muita dor de cabeça teria sido evitada.

Outro fator importante para ser observado sobre a cultura que prevalece em uma empresa é a própria relação que existe entre a liderança e a auditoria interna, pois esta última é uma questão séria e que exige cuidado.

A auditoria interna deve ter os recursos, independência necessária para cumprir suas funções e sem bloqueios de informações por parte da alta administração. É preciso haver uma relação de respeito e confiança que permita uma análise objetiva e independente das ações executadas pela gestão, incluindo um canal de comunicação, sem ruídos ou interferências, com o conselho de administração ou comitê de auditoria. Culturas saudáveis valorizam a supervisão e o trabalho executado pela auditoria interna, de modo a garantir a eficiência na prestação de contas e melhoria na governança corporativa.

Evitar ou combater possíveis fraudes, irregularidades e erros comprometedores são os principais tópicos da auditoria interna, com o objetivo de examinar a fundo controles internos e dados financeiros, contábeis e operacionais da organização. Considerada essencial no apoio dos gestores dentro da empresa, a área facilita e simplifica tarefas e elimina desperdícios no processo.

Uma cultura da organização baseada em valores éticos é o maior fator de prevenção de fraudes que englobam agentes internos. O fato de minimizar o risco de fraude dentro da companhia vai além da implantação de procedimentos e de controle. Honestidade, verdade, lealdade, justiça e comprometimento dentro da empresa devem ser incluídos de maneira implícita na forma de conduzir o negócio.

Vale lembrar que a relação entre a gestão e a auditoria interna deve ser, também, uma via de mão dupla e que não basta prevalecer somente de um dos lados. Ciente de que a prestação de contas e a transparência são aspectos compulsórios e vitais para o sucesso do negócio e longevidade da empresa, ou seja, uma liderança comprometida não permite que suas ações ultrapassem os limites éticos para atendimento das estratégias estabelecidas.
Reitero que o exemplo de uma conduta ética tem que vir de cima para baixo “top down”. Ao estabelecer uma base de ações e condições aceitáveis que sustentem uma cultura saudável, é mais fácil identificar indícios de ineficiências que podem pôr em risco a empresa.
Paulo Gomes é diretor executivo do Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA Brasil).

“Mais arriscado que mudar é continuar fazendo a mesma coisa.”

*Supõe-se que a citação atribuída à Peter Drucker tenha sido originada a partir da frase “Cultura – seja qual for a definição – é singularmente persistente”, escrita no artigo
“Don’t Change Corporate Culture-Use It!”, publicado no Wall Street Journal, em 1991.

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